quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Poema em linha torta

Nunca conheci país que tivesse levado porrada .
Todos os que conheço têm sido campeões em tudo.


E Portugal, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Portugal tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo (mais ainda que Berlusconi),
Portugal, que tantas vezes não tem tido paciência para tomar banho (e é rabo da Europa),
Portugal, que tantas vezes tem sido ridículo, absurdo,
Que tem enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tem sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tem sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não se tem calado, tem sido mais ridículo ainda (manifestações à rasca)
Este país, que tem sido cómico às criadas de hotel,
Este país, que tem sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Este país, que tem feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar (são os juros, juro),
Portugal, que, quando a hora do soco surgiu, se tem agachado
Para fora da possibilidade do soco (o trote de três cavalos?);
Portugal, que tem sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
espanta-se que não tem par nisto tudo neste mundo.


Todos os países que eu conheço e que produzem
Nunca tiveram um acto ridículo, nunca sofreram enxovalho,
Nunca foram senão príncipes - todos eles príncipes - no mundo...


Quem me dera ouvir de algum a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os vejo a ter um rendimento per capita aceitável.
Que país há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semi-Merkel's!
Onde é que há gente no mundo?


Então é só Portugal que é vil e erróneo nesta terra?


Poderão os governos não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E Portugal, que tem sido ridículo sem ter sido traído (sem ter sido traído, eh eh eh),
Como pode falar com os seus superiores sem titubear?
Este país, que tem sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


Adaptação de "Poema em linha recta" de Álvaro de Campos.